A “desculpa” da política

abril 27, 2016 § 2 Comentários

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People raising their hands

Há tempos tomei a decisão de não discutir política – que cá entre nós, me fez um enorme bem. Um pouco por perceber a política cada vez mais parecida com futebol e religião, dogmática. Cada um no seu lado e o resto adversário. Como não pretendo discutir política, apenas compartilhar impressões, me reservo o espaço para tal.

Percebo nos tempos atuais um comportamento político irresoluto. Frequentemente, disputas políticas não geram conclusões aceitáveis ou concordância relutante. Geram apenas acusações de roubo, rótulos de ilegitimidade e uma determinação em neutralizar o vitorioso, anular resultados ou revertê-los o mais rápido possível. Aconteceu nas eleições de 2014 e aconteceu agora, no processo de impeachment. Não é privilégio de nenhuma corrente política, mas um comportamento geral, compartilhado por todos.

A bem da verdade é que não é nem um “privilégio” brasileiro, acontece o mesmo comportamento em várias partes do mundo. É possível observá-lo, em todo seu “esplendor”, nas primárias americanas, onde os líderes do partido republicano insistem em tentar barrar a indicação de Donald Trump, mesmo sendo ele o favorito da maioria dos eleitores do partido e mesmo sem oferecerem um substituto viável – todos os demais concorrentes tem uma rejeição dos filiados maior do que a dele. O mesmo ocorre no partido democrata, em que os apoiadores do candidato Bernie Sanders insistem em dizer que a adversária, Hillary Clinton, frauda os resultados. Mesmo com ela sendo apoiada pela maioria dos eleitores do partido, com exceção de universitários brancos e artistas de hollywood.

Voltando à terra brasilis, eleições não “encerram” disputas porque há uma crença perniciosa de que elas não são um referendo do estado de espírito do povo e sim um intricado jogo de tabuleiro, com peças marcadas. Talvez pelo nosso passado autocrata, talvez pela falta de confiança crônica entre os brasileiros, mas a verdade é que se alguém considera que foi “passado para trás” ao invés de ter “perdido no voto”, qual o motivo para declarar trégua ou cooperar futuramente?

O processo democrático nunca foi suave e as derrotas raramente aceitas de maneira dócil. Frank Bruni, jornalista americano, conta que o ex-presidente Teddy Roosevelt criou em 1912 o partido progressivo apenas porque os republicanos indicaram o também ex-presidente William Howard Taft como candidato ao invés dele. Portanto, é natural um político não aceitar uma derrota. O que não é comum é a mesma atitude ser tomada pela maioria dos eleitores e mais incomum ainda, é o esforço coletivo em deslegitimar os vencedores – sejam eles quem forem.

Esta atitude diz muito a respeito da nossa sociedade: a grosseria do nosso discurso, o tribalismo cego dos nossos “debates”, a elevação do individualismo muito acima do propósito coletivo e o ethos de que todos são por direito de nascença vencedores na competição da vida (e não por conquista pessoal).

Esta forma de pensar leva seguidamente aos pedidos de “reforma política”, mais como uma “desculpa” para justificar o comportamento do que uma vontade genuína de melhorar o processo. Mudança verdadeira é muito diferente de rejeitar resultados desagradáveis. Se as mágoas nunca forem postas de lado, o processo democrático não tem chance. Se tudo for fraude, então como no amor e na guerra, tudo é válido. E nós, continuaremos a ter anos à frente de inércia e inépcia, seja quem for que esteja no poder. O Brasil é e será o que os brasileiros quiserem fazer dele. O quanto antes tomemos consciência deste fato, melhor para o país.

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