Quebrando a mesa… de reunião(?)

março 11, 2016 § Deixe um comentário

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Illustration by James Graham

Octavian Costache, um dos fundadores da start-up de compras Spring, costuma “tomar” a palavra nas reuniões semanais com todos os funcionários, promovidas na cozinha da empresa. Costache trabalhou durante anos na Google e é um dos criadores do Gmail e do Google Maps, portanto um “cara” que todos querem ouvir falar. Só de pigarrear, já chama a atenção na Spring. Foi o que fez em um dos encontros realizados em fevereiro último, queria falar sobre um assunto urgente: reunião.

Citando um artigo famoso de Paul Graham chamado “Maker’s Schedule, Manager’s Schedule”, apresentou o conceito que vinha “martelando” a sua cabeça. Segundo Graham, algumas pessoas “prosperam” em reuniões, e por isso necessitam de um calendário cheio delas, em horários e locais variados. Ele as chamou de “managers” (vou manter o termo original e não a tradução, gerentes, por uma questão de sintaxe). Mas uma empresa, em especial as baseadas em tecnologia (não por acaso, de onde Graham e Costache vieram), não é apenas formada por “managers”. Há aqueles cujo bem-estar pode ser “quebrado” por uma sala de conferências. Precisam de um tempo germinativo, muitas vezes solitário, para colocarem em prática a sua expertise. Graham as chamou de “makers”.

Para ilustrar a ideia, Costache colocou em um monitor um Google Calendar, com um mosaico colorido e tumultuado de afazeres, e o apresentou como “a semana ideal” de um “manager”. Em seguida, abriu um calendário novo, todo em branco, e o apresentou como o “paraíso” dos “makers”. Arrancou aplausos entusiasmados.

A verdade é que apenas as áreas de design de produto e de desenvolvimento, em uma empresa como a Spring, estão autorizadas a um calendário de “maker”. O restante precisa se equilibrar em videoconferências, ligações e encontros. A realidade coloca os verdadeiros “pingos nos is”. Como fazer então?

O próprio Paul Graham dá a dica. Quando perguntado se ainda apoiava as ideias contidas no “Maker’s Schedule, Manager’s Schedule”, saiu-se com um “claro que sim” – afinal foi ele quem escreveu o texto – mas acrescentou: “minha reunião ideal não tem mais do que 4 ou 5 participantes, que conhecem e confiam uns nos outros. Nada de powerpoint ou pessoas tentando impressionar umas às outras”. No texto anterior, escrevi um pouco sobre “QI coletivo” e como ele é estimulado em grupos que se comportam exatamente como na descrição da reunião de Graham.

Anos atrás, treinei durante alguns meses boxe. Não foi aonde me encontrei em termos de artes marciais – hoje pratico kung fu, que me proporciona momentos de incrível alegria – mas tenho uma dívida com a chamada “velha arte”. Existe duas coisas em comum entre o boxe e começar uma empresa que notei com o passar do tempo (vou chegar mais à frente no que isto tem “a ver” com reuniões). A primeira é que são atividades extremamente solitárias. Certamente se tem a ajuda de amigos, mentores e treinadores, mas quando a luta começa, é só você no “ringue”. O segundo, é que a “luta” propriamente dita tem pouco a ver como trabalho em si, é uma porção bem pequena do que se tem que fazer. O verdadeiro trabalho acontece quando ninguém está olhando: o treino, a preparação. Muitas vezes só nos damos conta quando estamos recebendo as pancadas.

Reuniões são como treinos. Em uma empresa, assim como no boxe, ter as pessoas certas auxiliando na preparação pode ser a diferença entre sair da “luta” só com um olho roxo ou direto para o hospital. Entendo a “reclamação” de Costache e Graham não como uma diatribe contra reunião, mas contra a perda de tempo. Se pudesse ser vendido no mercado financeiro, creio que “investir” em tempo daria o maior retorno de todos – dado o quão valioso ele é. É preciso critério para marcar, participar e até encerrar uma reunião. Ela precisa ser significativa, do contrário é inevitável a sensação de tempo perdido. Ser significativa, para mim, não implica necessariamente gerar algum plano ou decisão – mas contar efetivamente como um passo a mais (não necessariamente adiante) no processo de trabalho. Mesmo porque, como disse certa vez Mike Tyson – voltando à analogia do boxe – “todo mundo tem um plano até levar o primeiro soco na cara”.

Criar algo – e não se engane, esta é a razão de reuniões – está relacionado ao “caminho”, não ao “resultado final”. É o caminho que conduz a intenção. O que os “reformadores de reuniões” quase não abordam é que elas funcionam como “abrigos de mentes” e quando bem combinadas entre participantes, que sabem o que querem e respeitam as opiniões alheias, podem atuar como um “celeiro” de boas ideias. O caminho é o processo.

Para fechar, deixo como reflexão uma frase do grande treinador de boxe Cus D’Amato: “não importa o que se diga, não importa a desculpa ou a explicação dada, no final das contas, o que uma pessoa faz é o que ela queria fazer desde o início”.

Qual é o processo das suas reuniões?

Educação corporativa em 2020

outubro 30, 2015 § Deixe um comentário

lifelong-learning-companies-21st-century Enquanto o tempo de uso da internet aumenta, diminui o tempo que “gastamos” lendo uma notícia ou visitando websites. Quanto mais diversificada a informação consultada, menos profundidade se dá a cada uma delas. Essa é uma tendência bem atual – não é à toa que qualquer informação no Twitter tem que ser passada em 140 caracteres.

Não é tarefa fácil analisar o impacto dessa mudança de comportamento no futuro, mas uma coisa é certa: é evidente que “consumimos” a informação de maneira diferente hoje e é essa forma que nos leva a procurar por respostas ou soluções imediatas para as questões do dia a dia. Não quero entrar em conclusões (principalmente se a prática é boa ou não), mas com base no comportamento, é compreensível a expectativa da “imediatibilidade”.

No nível corporativo, a tendência influencia a comunicação entre a empresa e seus clientes, seus funcionários, a sua infraestrutura, a sua dinâmica de trabalho, etc. Não é uma questão tecnologia apenas, é algo mais profundo. Não é uma mudança de paradigma (perdoem-me o chavão, mas em alguns momentos ele é válido) na comunicação e sim nas relações sociais. Levar em conta as implicações sociais dessa tendência auxilia a se adaptar a ela (e a se beneficiar dela, por que não?).

Em educação corporativa, penso que essa tendência pode (e deve) influenciar a maneira como os funcionários “visualizam” seu próprio treinamento.  Na minha opinião, essa “visualização” passa (ou vai passar) por alguns pontos:

  • Uma forte preferência para canais de comunicação que permitam transmissão de dados tanto síncrona quanto assíncrona. Para quem não está familiarizado com os termos, dê uma olhada AQUI.
  • Flexibilidade é uma expectativa chave. Funcionários esperam cada vez mais flexibilidade, em todos os níveis, com isso ela deixa de ser uma demanda e passa a ser uma necessidade.
  • Flexibilidade impacta em outro tópico, autogerenciamento. Sei que não “serve” para todos os perfis, mas impacta de alguma forma na utilização do tempo, das ferramentas e dos recursos usados para o trabalho.
  • O fenômeno BYOD (Bring Your Own Device – algo como “traga o seu próprio aparelho) é cada vez mais notável. A empresa deve se preparar e chegar a um acordo em relação ao uso de aparelhos ou serviços que, a priori, parecem dispensáveis para a performance dos funcionários. Vai desde serviços e aplicativos como Evernote, até ferramentas mais complexas como os “ambientes de desenvolvedores” nas nuvens (os IDEs).
  • Informações apresentadas de forma clara e direta. A tendência descrita no início do texto, impacta diretamente aqui. As pessoas tendem a se beneficiar mais tendo contato com o “núcleo” da questão.
  • Outro ponto em relação à apresentação de informação diz respeito à sua aparência. A tendência também influencia diretamente no modo como se “escolhe” a informação, portanto fazê-la parecer interessante e chamativa é importante (novamente, não entro em conclusões em relação à qualidade da prática). Dessa maneira, o conteúdo multimídia se torna especialmente relevante.
  • É indispensável considerar a mobilidade como ponto fundamental na educação corporativa. Não apenas na “entrega” ou disseminação da ação educacional, mas como um modo de facilitar a ubiquidade[1] dos funcionários.

Concorde-se ou não com a tendência exposta, é preciso ter em mente duas coisas. A primeira é que a razão disto não é a tecnologia, mas o uso que escolhemos fazer dela. O elemento “tempo” foi propositalmente deixado de fora quando se criou a “programação computacional”. Isso quer dizer que para a “máquina” pouco importa se você vai responder uma mensagem em 2 segundos ou em 10 horas. Dá no mesmo para ela, o que importa são os comandos. A “máquina” só vai enviar quando você der o comando “send”.

A segunda é que na era da conectividade permanente, o aprendizado tende a caminhar para o não-formal. Isso quer dizer que colocar um grupo em um mesmo espaço para participar de um treinamento ou um workshop corporativo nos moldes tradicionais vai ser, cada vez mais, difícil. É preciso começar a deixar um pouco de lado os conceitos do Malcolm Knowles (que popularizou o modelo palestra/curso/workshop) e começar a “misturar” Alan Turing com John Dewey, incluir a tecnologia e a implementação prática para estimular o aprendizado.

[1] Não é um termo usual, mas significa a faculdade “divina” de estar concomitantemente “presente” em toda parte e a todo momento.

Inovação e adaptabilidade

setembro 3, 2015 § 7 Comentários

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Bycast, uma empresa com sede em Vancouver, tinha como foco de atuação até meados dos anos 2000, o envio de vídeo e conteúdo de áudio em forma comprimida através da Internet.  Com a popularização do YouTube e dos vídeos steaming, esse mercado desapareceu quase que “da noite para o dia”. A empresa precisava encontrar um novo mercado, “o tempo estava se esgotando e o nosso capital estava sendo queimado no processo de busca”, lembra Alan Chiu, ex-diretor da empresa.

A solução veio de uma fonte improvável, a instituição médica canadense The British Columbia Cancer Agency. Com uma “biblioteca” de CDs com imagens médicas que enchiam salas e mais salas, a instituição tinha cada vez mais dificuldades em mantê-los organizados e disponíveis para os médicos e pessoal autorizado das suas instalações de saúde. Como solução, a Bycast desenvolveu um software que auxiliava a gerenciar uma quantidade massiva de dados em diferentes localidades geográficas. “Isso levou à descoberta de um segmento de mercado em torno de imagem médica e compartilhamento de dados em vários locais”, Chiu lembra. Quando a Bycast foi adquirida pela NetApp em 2010, a sua base de dados incluía alguns dos maiores repositórios de conteúdo digital do mundo.

A inovação surge de maneira inusitada, mas uma das características essenciais do processo é a flexibilidade. É ela que permite que não nos agarremos a soluções costumeiras e nos adaptemos. Alan Chiu virou um dos sócios da Xseed Capital, uma empresa que atua como investidor-anjo[1] em novos negócios. Nesta posição, tem ajudado jovens empreendedores tanto financeiramente, quanto compartilhando seu conhecimento em negócios. Essa experiência o levou a ser convidado pela Universidade de Stanford – é um ex-aluno de lá – a contar um pouco da sua experiência e dar dicas de melhores práticas (para assistir ao vídeo, clique AQUI). Um dos seus conselhos, penso eu, transcende o mundo corporativo e pode ser aplicado em nossa própria vida.

“Seja intelectualmente honesto e adaptável” diz ele. Empreendedores (não só, mas também) tendem a ser pessoas naturalmente otimistas, mas não convém manter um “otimismo cego”. Quem é otimista sem ser honesto consigo mesmo está mais suscetível a ser enganado pelos seus próprios preconceitos. Estar aberto a novas informações, novos dados e novas recomendações é o primeiro passo para exercitar a sua habilidade em se adaptar.

Isto não quer dizer que não possamos ter nossas convicções, pelo contrário, acreditar em algo é de extrema importância para se chegar em algum lugar. Mas é preciso estar aberto à mudança e à correção de rumo.

Tricia Seibold, uma excelente designer e aluna em Stanford nos presenteia com seu talento, compartilhando um infográfico com as principais dicas da palestra do Alan Chiu. Em um post anterior, compartilhei um dos seus infográficos atribuindo-o a alunos de Stanford. Aproveito aqui para retificar a minha informação.

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[1] É o investimento efetuado por pessoas físicas ou jurídicas em empresas nascentes com alto potencial de crescimento (as startups) apresentando as seguintes características: é efetuado por profissionais (empresários, executivos e profissionais liberais) experientes, que agregam valor para o empreendedor com seus conhecimentos, experiência e rede de relacionamentos além dos recursos financeiros, por isto é conhecido como smart-money ; tem normalmente uma participação minoritária no negócio; não tem posição executiva na empresa, mas apoiam o empreendedor atuando como um mentor/conselheiro.

Mundo acadêmico e corporativo

julho 30, 2015 § 2 Comentários

Esta semana tive a oportunidade de participar de um workshop no instituto de ciências políticas da UERJ. Como de costume, as discussões e debates do evento foram de alto nível, mas (também como de costume) o que aconteceu fora da “sala”, nas conversas do cafezinho, almoço e confraternizações me chamaram tanto a atenção quanto o evento em si.

Como um proveniente do mundo corporativo, fui solicitado por alguns dos participantes a compartilhar minhas impressões a respeito do mundo acadêmico e seu impacto na comunidade dos negócios. Sendo o mais diplomático possível, disse identificar uma falta de interesse mútuo entre a academia e os negócios no Brasil. Tirando algumas iniciativas em relação à suporte em consultoria e ações como incubadoras de empresas, não via uma parceria muito abrangente.

O “papo” evoluiu para um “exercício” de propostas destinadas a estimular um diálogo entre dois mundos que não conversam tanto quanto poderiam. Duas delas me pareceram bem razoáveis por serem, na minha opinião, implementáveis em curto prazo.

Parceria em pesquisa

São formadas quando empresa e universidade concordam em colaborar em um determinado projeto de pesquisa. É muito comum em áreas como a farmacologia. Geralmente são conduzidas por pesquisadores mais graduados de instituições acadêmicas e financiadas por empresas, que viram sócias da propriedade intelectual desenvolvida. Propus fazer algo semelhante, mas envolvendo estudantes não tão graduados, que poderiam ter a oportunidade de realizar pesquisas para uma empresa via academia. Meu argumento girou em torno de um ponto: ao demonstrar suas habilidades aplicadas em um negócio, um estudante aumenta a sua “empregabilidade”. Não é um estágio, a pessoa atua pela universidade, mas em contato direto com uma empresa.

Parcerias de formação

É a criação (ou direcionamento) de cursos baseados em necessidades específicas das empresas. Meu exemplo se baseou na experiência de parceria entre empresas de TI e instituições acadêmicas que oferecem o nanodegree. O benefício deste tipo de programa para os estudantes é uma formação focada na implementação prática do conhecimento (além da possibilidade de contratação) e, para as empresas, ter indivíduos especialmente formados. Como potenciais desafios foram levantados dois pontos: (1) uma formação que só pode ser aplicada ao negócio específico e (2) a empresa exigir uma cláusula de “não concorrência” para os estudantes. Pontos que, ao meu ver, são passíveis de negociação entre as partes e não incapacitam a iniciativa.

Fui muito bem recebido, conheci pessoas interessantes nessa experiência e tive a oportunidade de trocar ideias com elas. Fiquei muito satisfeito também em conhecer iniciativas da academia brasileira para facilitar a geração de propriedade intelectual e o esforço que acadêmicos brasileiros e estrangeiros, como os professores alemães Wolfgang Merkel, que se juntará ano que vem à equipe da UERJ e a professora Brigitte Weiffen, que já faz parte do corpo docente da USP, fazem neste sentido. São duas mentes inquietas que conseguimos trazer ao nosso convívio. O país certamente se beneficiará disto no futuro.

Aprendizes e Estudantes

abril 20, 2015 § Deixe um comentário

Uma das maiores discussões, na maior parte dos países ocidentais, quando o assunto é sistema educacional moderno, é em relação ao seu foco. No Brasil, o enfoque está meio que resolvido, deveríamos focar em “criar” cidadãos conscientes socialmente, como direciona nossa Constituição Federal e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Mas, o que significa isto? Bons estudantes são bons cidadãos? Ou deveríamos procurar estimular que se tornem aprendizes habilidosos? Há uma diferença, e não é apenas semântica, entre estudante e aprendiz. Vamos a ela:

1. Relacionamento com os educadores:

Estudantes são como funcionários, se espera que direcionem seu interesse em sintonia com o interesse da escola ou do currículo (algumas esperam simplesmente que se comportem e sigam as instruções). Aprendizes possuem interesses mais variados e preferem ter liberdade de auto-direcionar o seu aprendizado.

 2. Relacionamento com os pares

Estudantes são competidores. O “ano letivo” nada mais é do que uma competição de longa duração e desde a minha época de estudante, o objetivo final era “passar no vestibular” (hoje é tirar uma boa nota no ENEM). Aprendizes são colaboradores. Quem já experimentou aprender algo apenas por prazer ou sem nenhum objetivo definido, sabe do que falo. É só procurar algum grupo de discussão na internet para comprovar na prática.

 3. Motivação

Estudantes são estimulados a “trabalhar” por uma compensação (a nota, passar de ano, entrar na faculdade, etc.). Aprendizes são motivados em entender e gerar valor com o seu “trabalho”.

 4. Compensação

Estudantes esperam como compensação pelas suas notas, uma porta de entrada para a faculdade ou um bom emprego. Aprendizes possuem um senso de “missão a cumprir” ao longo do processo. A “meta” não é recompensada, é conquistada, não é simbólica, é um investimento.

 5. Modo de operação

Estudantes são complacentes, disciplinados, orientados por objetivo e treináveis. Aprendizes são perceverantes, auto-disciplinados, orientados por resultado e engenhosos.

Um dos grandes diferenciadores dos bons estudantes dos aprendizes habilidosos são as notas. O primeiro grupo é bastante motivado por elas. E essa motivação é extremamente recompensada ao longo da sua “carreira” estudantil. Essa orientação traz 3 consequências:

A primeira, é a perda de interesse pelo aprendizado. Na medida em que a motivação em obter boas notas cresce, a motivação em explorar ideias tende a decrescer.

A segunda, é a prática de evitar tarefas desafiadoras sempre que possível. Afinal, quanto mais difícil a tarefa, maior é a possibilidade de não conseguir uma boa nota.

A terceira, está relacionada à qualidade do aprendizado. Bons estudantes, apesar de completarem suas tarefas, passarem em testes e conseguirem boas notas têm dificuldade em se lembrar do que aprenderam após o exame final. Segundo o pesquisador Eric Mazur, também professor de física aplicada da Universidade de Harvard, 2 meses após o exame final, 90% dos estudantes volta ao nível de conhecimento que tinha no início do semestre anterior.

A ironia do enfoque dado à educação brasileira é que temos hoje, em 2015, um mercado saturado de profissionais com diplomas com dificuldade em encontrar emprego, uma vez que os empregadores valorizam pessoas com rápida capacidade adaptativa e de aprendizado e com habilidade em aplicar o que sabem (apesar destas habilidades só serem passíveis de serem checadas no decorrer do próprio trabalho, a orientação de seleção é essa). Em resumo, um mercado que procura (pelo menos teoricamente) aprendizes habilidosos e não bons estudantes.

Penso que é hora de aceitar os fatos e repensar o foco que queremos para o nosso sistema educacional.

Sobre Briefings (e outros textos)

dezembro 5, 2012 § Deixe um comentário

THE WINNING BRIEF

Por que começar um texto com uma frase em inglês? Asseguro a todos que não é um “ataque” de pedantismo ou uma necessidade irrefreável de parecer culto. Este é o título de um livro muito interessante escrito há alguns anos por Bryan Garner, que é um especialista americano em textos jurídicos, ou melhor, em como escrever textos jurídicos. Seus livros têm lugar garantido na estante de boa parte dos estudantes de direito dos países de língua inglesa.

Mas o que um sujeito de uma área tão específica tem a ver com educação ou comunicação corporativa?

Vamos começar com uma pequena explicação: em inglês, o verbo “to brief” (da onde vem a palavra “briefing”, que fala tão alto aos corações corporativos brasileiros) significa  informar rapidamente. No livro citado acima, Garner aborda uma série de dicas de como escrever um texto de maneira clara, sucinta e assertiva. Facilita ou não o dia a dia de muita gente?

Quem se interessar em ler o original, adianto que são 100 dicas explicadas e exemplificadas detalhadamente. Como muitas delas são direcionadas para cortes de apelação ou julgamentos, tomei a liberdade de escolher as que considerei mais genéricas e dessa maneira, mais adequadas para serem implementadas em briefings ou textos corporativos. Pretendo abordar a seguir, o meu “Top 10”.

DICA 1: PROGRAME CADA TEXTO POR PARTES

Se programar antes de começar a fazer algo nunca é demais, esta máxima também é verdadeira para escrever. É claro que cada um pode desenvolver o seu jeito pessoal para construir textos, mas o processo criado pela dra. Betty Flowers, professora de redação da Universidade do Texas, se sobressai pela simplicidade.

No processo, que ficou conhecido como  “paradigma de Flowers”, é sugerido que o escritor assuma 4 personagens durante o seu processo de desenvolvimento (Louco – Arquiteto – Carpinteiro – Juiz).

Louco: é o primeiro personagem. Flowers sugere que se deixe o louco tomar conta em um primeiro momento para que  possamos colocar no papel todas as ideias, tudo o que se quer dizer, sem pré-julgamento.

Arquiteto: após a passagem do louco, devemos usar o personagem do arquiteto para pegar as ideias que estão no papel e fazer as conexões necessárias entre elas, para que possamos criar a estrutura do texto.

Carpinteiro: com a estrutura pronta, é hora de se vestir de carpinteiro e começar a construir o texto. É o momento de escrever efetivamente.

Juiz: por fim, devemos reler o que escrevemos e julgar se tudo o que queríamos dizer está explicado de maneira linear e clara. Estas 2 palavrinhas aliás, fazem toda a diferença. Como um texto não é acompanhado de entonação vocal ou linguagem visual, é preciso que se construa uma narrativa que seja coerente e siga claramente um caminho. A ambiguidade colocada no “papel” é a maneira mais rápida de não se fazer entender.

DICA 2: DEFINA ANTES O QUE VAI FAZER

É basicamente o trabalho que devemos realizar quando estamos “vestidos” do personagem do arquiteto. Essa dica deve ser encarada como o complemento da dica anterior.

Antes de mais nada, devemos definir os pontos que serão cobridos no texto e elaborar a descrição do que se vai escrever. Garner chama esse momento de definir a premissa, eu prefiro algo menos contundente como sinopse ou idéia original, porque até finalizar o texto, é possível fazer modificações no sentido do que se quer passar. Mas, uma vez finalizado e divulgado, é obra fechada (se não passamos por incoerentes).

Depois, devemos mostrar pontualmente cada tópico para não esquecermos do que temos que escrever. Se estivermos utilizando alguma argumentação que justifique o ponto de vista escrito, devemos considerar possíveis contra-argumentos (sempre é possível se questionar “o quê”, “por quê” e “como” em qualquer assunto). Por isso, deve-se deixar claro no próprio texto os motivos e razões do que se está escrevendo.

DICA 3: TESTE DOS 90 SEGUNDOS

Confesso que essa é uma das dicas que mais achei interessantes. Ela diz que todo briefing deve esclarecer o seu ponto principal em até 90 segundos (daí o nome  do teste). Se o próprio significado da palavra indica que se quer passar uma informação rápida, nada mais natural do que utilizar pouco tempo para a sua leitura e entendimento.

Para que consigamos colocar em prática, é preciso deixar de lado aquela vontade de ser detalhista (isto pode ser feito em algum anexo ao briefing e não no próprio). Abaixo, alguns pontos a se considerar quando estiver escrevendo o seu texto:

  1. Coloque o ponto principal no início do texto.
  2. Quebre em frases separadas na forma de premissa-questão-resposta (lembrando que premissa é o ponto ou idéia que se parte para organizar um raciocínio).
  3. Apresente fatos que ajudem o leitor a realmente entender o que você escreveu.
  4. Escreva de modo a evitar duplas interpretações.

DICA 4: AJUDA VISUAL

Em algumas situações, é melhor desenhar do que escrever. Não precisa ser nada muito elaborado, gráficos, diagramas e desenhos simples podem ser de grande ajuda quando a sua intenção é se fazer entender rapidamente.

Um bom exemplo são os desenhos de planta baixa de residências que as construtoras fazem para “vender” os seus produtos. Apesar de termos uma descrição textual da unidade oferecida, o entendimento rápido de como é (ou será) a residência é feito de maneira visual.

Quando achar que uma idéia possa ser melhor explicada gráficamente, tente trabalhá-la visualmente da maneira mais simples possível, de forma que alguém que olhe perceba imediatamente o que você quer explicar. Depois, o combine com o seu texto, fazendo referências ao  gráfico/desenho.

Lembre-se, não é preciso fazer nada tão criativo ou ambicioso, o importante é que o ajude a passar a sua informação.

DICA 5: ESCRITA SIMPLES

Quem nunca se deparou com um texto que por mais que se leia e releia, não conseguimos entender? Um texto incompreensível ou mal planejado não demonstra credibilidade. Esta máxima é válida tanto para textos longos, quanto breves.

O que torna um texto fácil ou difícil de se ler, pode ser definido em 2 palavras: narrativa e prosa.

Narrativa, é a história que se quer contar (também chamado de enredo). Pode ser feita de maneira objetiva –  onde os fatos são apenas informados, sem envolvimento do escritor – como em um noticiário, por exemplo. Ou então de maneira subjetiva – onde há envolvimento de sentimentos e o uso de efeitos psicológicos importantes para o desenvolvimento do texto – como em um conto ou romance.

Prosa, é o estilo usado para desenvolver o seu texto, a forma como ele é escrito. Sei que não é preciso nem falar, mas vale reforçar a importância de seguir as regras gramaticais e ortográficas da nossa língua.

O “segredo” aqui é manter a simplicidade. Escrever bem não é usar palavras difíceis, e sim palavras simples, que dêem o significado que você quer dar. Quando a intenção é “passar o recado” rapidamente, como no briefing, esta dica é mais do que válida.

DICA 6: FACILITE O ENTENDIMENTO DA SUA FRASE

Essa dica pode ser resumida da seguinte maneira: nunca escreva uma frase que você não possa dizer facilmente. Como se pode perceber, é um complemento da dica anterior (tanto uma, quanto a outra abordam o ato de se escrever o texto).

Este cuidado evita principalmente que se escreva frases absurdas ou incompreensíveis, o que nunca é bom para a reputação do escritor. Para colocar em prática, basta exercitar o que Garner chamou de “ouvido interno”, aquela percepção que temos sempre ao reler o que escrevemos.

Uma boa maneira de colocar para “trabalhar” o “ouvido interno”, é verificar como você falaria o que está escrevendo. As frases abaixo exemplificam a idéia:

  • “Esse rádio necessita de reparos desde o dia em que realizei a sua compra.”
  • “Esse rádio nunca funcionou direito!”

A diferença entre uma frase e outra é facilmente percebida. Apesar de ambas comunicarem a mesma coisa, a segunda é mais simples e direta do que a primeira. Um texto simples não significa menos elaboração, mas sim assertividade.

DICA 7: APRESENTE IDÉIAS IMPORTANTES EM LISTAS

Na verdade, o ponto principal abordado na dica é a organização da informação. É mais fácil digerir uma informação quando ela vem em pequenas partes, por isso as listas são muito usadas, elas são fáceis de ler e de lembrar. Além de ajudarem o escritor a pensar com mais clareza.

Certamente a lista não é a única maneira de organizar textualmente uma informação, mas ganha espaço pela facilidade de se colocar em prática com resultados, na maioria das vezes, satisfatórios.

Uma das vantagens de usá-la, é a sua “flexibilidade” dentro de um texto. Pode ser aplicada para listar:

  • tópicos,
  • opções,
  • questões,
  • argumentos,
  • enfim, sintetizar qualquer informação, em qualquer momento.

Ao adicionar marcadores (também chamados de bullets nos programas de edição de texto) ou numeração, atraímos visualmente o leitor para a informação que queremos chamar a atenção – como fiz no parágrafo anterior.

Mas atenção, as listas funcionam apenas quando os itens são similares em natureza e importância. Nada de sair escrevendo textos como se estivesse em um arquivo de “PowerPoint”.

DICA 8: NÃO DIGA, MOSTRE

Levei um certo tempo para decidir se incluiria esta dica. Pareceu-me, em um primeiro momento, muito voltada ao universo jurídico, uma vez que advogados (o público primário do livro) necessariamente precisam se basear em fatos e não em suposições para desenvolver seus argumentos. Mudei de idéia rapidamente. Afinal de contas, em qual profissão ou mercado isto não acontece?

Muitos preferem escrever a respeito de pensamentos, sentimentos ou atitudes em relação a um assunto ao invés de mostrar fatos, ações ou evidências. Esta prática pode causar transtornos quando precisamos demonstrar a importância de algo, principalmente em textos curtos.

A palavra-chave aqui é persuasão. Ninguém se convence apenas baseado em opinião alheia, é preciso que a opinião se sustente em algo facilmente perceptivo (como fatos, ações ou evidências).

Em um briefing, há bastante espaço para utilizar a dica. É possível fazê-lo no objetivo, na descrição do que se quer pedir ou até mesmo no seu fechamento. Vale frisar aqui que para concluir qualquer texto, é preciso primeiro “ganhar esse direito”, mostrando fatos ao leitor.

Portanto, não diga apenas que algo é necessário, mostre porque é. Se puder deixar que o próprio leitor faça essa conclusão, seu texto será ainda mais eficaz.

DICA 9: FECHAMENTO PODEROSO

Lembro que um dos primeiros conselhos que recebi ao escrever um texto foi dar uma atenção especial à abertura (para estimular a leitura) e ao fechamento dele (para gerar satisfação ao leitor). Inícios e fins são realmente importantes porque são usualmente os que mais impactam na lembrança da experiência vivida.

Geralmente, é recomendado que se faça um fechamento poderoso revendo seus pontos de vista ou relembrando o leitor do que você escreveu durante o texto. Deste modo, se reforça o que foi escrito e se fecha o texto com o que você quer que o leitor realmente se recorde.

Em briefings, a introdução e o fechamento são muito próximos – até pela necessidade de brevidade do texto – o que torna esta dica um pouco mais desafiadora. Como evitar se tornar repetitivo?

Uma boa maneira é começar mostrando a necessidade (o que motivou o briefing) e finalizar com o que deve ser feito (o pedido em si). Assim se tem facilmente identificados o contexto em relação ao projeto e o projeto em si.

DICA 10: SE COLOQUE NO LUGAR DO LEITOR

Escrevemos sempre para seres humanos e não para áreas, fornecedores, clientes ou entidades mais abstratas como governo ou sociedade. Este é um foco que deve estar sempre em nossa mente quando estivermos escrevendo algum texto.

Dito isto, escreva para um ser humano, imagine a pessoa que lerá, “fale” com ela pelo texto.Se escrever para ninguém em particular (o famoso “para quem interessar possa”), fatalmente será percebido por quem ler e prejudicará o resultado que você quer alcançar.

Agora, pense nessa pessoa com dezenas de outros textos (emails, relatórios, recados, etc.)  na mesa. Para ela trocar o seu texto por outra coisa é mais fácil do que se imagina. Um bom texto, independente do seu tamanho, é aquele que pega o leitor e o faz sentar para lê-lo com vontade.

Em outras palavras, é necessário que o seu briefing “diga”claramente  o que quer, o que precisa fazer e porquê. Por isso, a revisão do que se escreveu é essencial para garantir que nos faremos entender.

Depois de escrever o seu texto, releia sempre tendo na cabeça: se eu estivesse lendo isso pela primeira vez, eu entenderia?

Se a resposta for não, não hesite. Escreva tudo de novo!

COMO JÁ DEVE TER NOTADO…

Escolhi as dicas e as ordenei no texto de uma determinada maneira, contemplando cobrir as fases por que passa a maioria dos escritores no seu processo criativo. São elas:

Definição do Processo, abordado na dica 1.

Planejamento, abordado nas dicas 2 e 3.

Desenvolvimento, abordado nas dicas 4, 5, 6, 7, 8 e 9.

Revisão, abordada na dica 10.

Vale dizer que essas fases não são fechadas, tendo que ocorrer somente nesta ordem para funcionar. O ato de escrever aceita flexibilidade, pois é antes de tudo, pessoal. Mas quando não temos tanta prática ou ainda estamos buscando o nosso estilo, elas funcionam como um direcionamento.

Na vida profissional (diria até, na vida de maneira geral) a qualidade da escrita tem importância. Assim como pode ajudá-lo a ganhar um caso, fechar uma venda, conquistar uma promoção ou se expressar com clareza, pode também causar confusão ou fazê-lo parecer menos competente do que é.

O cuidado com a escrita não deve se restringir a escritores. Deve ser uma preocupação de todos nós.

Afinal de contas, se escrevemos algo, podemos nos considerar escritores – mesmo que apenas durante aqueles momentos em que teclamos o que queremos expressar em palavras escritas na tela do computador.

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