Educação corporativa em 2020
outubro 30, 2015 § Deixe um comentário
Enquanto o tempo de uso da internet aumenta, diminui o tempo que “gastamos” lendo uma notícia ou visitando websites. Quanto mais diversificada a informação consultada, menos profundidade se dá a cada uma delas. Essa é uma tendência bem atual – não é à toa que qualquer informação no Twitter tem que ser passada em 140 caracteres.
Não é tarefa fácil analisar o impacto dessa mudança de comportamento no futuro, mas uma coisa é certa: é evidente que “consumimos” a informação de maneira diferente hoje e é essa forma que nos leva a procurar por respostas ou soluções imediatas para as questões do dia a dia. Não quero entrar em conclusões (principalmente se a prática é boa ou não), mas com base no comportamento, é compreensível a expectativa da “imediatibilidade”.
No nível corporativo, a tendência influencia a comunicação entre a empresa e seus clientes, seus funcionários, a sua infraestrutura, a sua dinâmica de trabalho, etc. Não é uma questão tecnologia apenas, é algo mais profundo. Não é uma mudança de paradigma (perdoem-me o chavão, mas em alguns momentos ele é válido) na comunicação e sim nas relações sociais. Levar em conta as implicações sociais dessa tendência auxilia a se adaptar a ela (e a se beneficiar dela, por que não?).
Em educação corporativa, penso que essa tendência pode (e deve) influenciar a maneira como os funcionários “visualizam” seu próprio treinamento. Na minha opinião, essa “visualização” passa (ou vai passar) por alguns pontos:
- Uma forte preferência para canais de comunicação que permitam transmissão de dados tanto síncrona quanto assíncrona. Para quem não está familiarizado com os termos, dê uma olhada AQUI.
- Flexibilidade é uma expectativa chave. Funcionários esperam cada vez mais flexibilidade, em todos os níveis, com isso ela deixa de ser uma demanda e passa a ser uma necessidade.
- Flexibilidade impacta em outro tópico, autogerenciamento. Sei que não “serve” para todos os perfis, mas impacta de alguma forma na utilização do tempo, das ferramentas e dos recursos usados para o trabalho.
- O fenômeno BYOD (Bring Your Own Device – algo como “traga o seu próprio aparelho) é cada vez mais notável. A empresa deve se preparar e chegar a um acordo em relação ao uso de aparelhos ou serviços que, a priori, parecem dispensáveis para a performance dos funcionários. Vai desde serviços e aplicativos como Evernote, até ferramentas mais complexas como os “ambientes de desenvolvedores” nas nuvens (os IDEs).
- Informações apresentadas de forma clara e direta. A tendência descrita no início do texto, impacta diretamente aqui. As pessoas tendem a se beneficiar mais tendo contato com o “núcleo” da questão.
- Outro ponto em relação à apresentação de informação diz respeito à sua aparência. A tendência também influencia diretamente no modo como se “escolhe” a informação, portanto fazê-la parecer interessante e chamativa é importante (novamente, não entro em conclusões em relação à qualidade da prática). Dessa maneira, o conteúdo multimídia se torna especialmente relevante.
- É indispensável considerar a mobilidade como ponto fundamental na educação corporativa. Não apenas na “entrega” ou disseminação da ação educacional, mas como um modo de facilitar a ubiquidade[1] dos funcionários.
Concorde-se ou não com a tendência exposta, é preciso ter em mente duas coisas. A primeira é que a razão disto não é a tecnologia, mas o uso que escolhemos fazer dela. O elemento “tempo” foi propositalmente deixado de fora quando se criou a “programação computacional”. Isso quer dizer que para a “máquina” pouco importa se você vai responder uma mensagem em 2 segundos ou em 10 horas. Dá no mesmo para ela, o que importa são os comandos. A “máquina” só vai enviar quando você der o comando “send”.
A segunda é que na era da conectividade permanente, o aprendizado tende a caminhar para o não-formal. Isso quer dizer que colocar um grupo em um mesmo espaço para participar de um treinamento ou um workshop corporativo nos moldes tradicionais vai ser, cada vez mais, difícil. É preciso começar a deixar um pouco de lado os conceitos do Malcolm Knowles (que popularizou o modelo palestra/curso/workshop) e começar a “misturar” Alan Turing com John Dewey, incluir a tecnologia e a implementação prática para estimular o aprendizado.
[1] Não é um termo usual, mas significa a faculdade “divina” de estar concomitantemente “presente” em toda parte e a todo momento.
Edtech – mídia social e colaborativa
outubro 27, 2015 § Deixe um comentário
Para finalizar essa sequência de posts a respeito do conceito “Edtech”[1], nada melhor do que abordar a ferramenta tecnológica mais popular dos dias de hoje, a rede social. Os pesquisadores Eunice Ivala e Daniela Gachago da Cape Peninsula University of Technology, na África do Sul, encontraram uma relação positiva entre o uso da mídia social e o engajamento de aprendizes. Em um estudo publicado em 2012, descobriram que o uso apropriado de blogs e grupos no Facebook aumentam a integração acadêmica, dentro e fora do campus, e aumentam o engajamento em atividades de aprendizagem.
Isto acontece por conta do “poder colaborativo” da rede social. Ao fornecer uma “estrutura” para comentários e compartilhamento de tarefas, estas ferramentas dão oportunidades para que os aprendizes mostrem suas habilidades multimídias e o modo como “constroem” determinado trabalho acadêmico. Isto torna a discussão mais envolvente, aumentando o nível de troca intelectual.
A mídia social também promove o que os especialistas chamam de “conceito check-up”, que a exemplo do similar exame médico, permite identificar problemas e determinar caminhos de ação ao se analisar as interações registradas nela.
Outros dois artigos acadêmicos dão suporte ao estudo citado acima. A pesquisadora Latha R. Chandrasekar conseguiu medir o impacto da mídia social e ferramentas colaborativas no comportamento emocional e no engajamento cognitivo de estudantes. Os pesquisadores da Universidade de Sheffield, na Inglaterra, Tom Stafford, Herman Elgueta e Harriet Cameron descobriram que o uso de ferramentas do tipo Wiki (cujo melhor exemplo é a Wikipedia) aumentam a habilidade de escrita dos seus usuários.
Estudos deste tipo ajudam a mostrar que, dependendo de como são utilizadas, ferramentas tecnológicas podem estimular e aumentar o aprendizado. A forma como as utilizamos é pessoal, se a opção for pelo uso restrito será este o resultado que se terá. Mas a boa notícia é que o antônimo também é verdadeiro.
Quem quiser conhecer mais dicas de como a mídia social pode ser usada para estimular o engajamento, recomendo o guia produzido pela associação WISE (Wales Initiative for Student Engagement), do País de Gales, que o disponibilizou pela plataforma Moodle.
[1] Para relembrar, o termo “Edtech” é utilizado para se referir ao uso da tecnologia em educação.
Conexão do Conhecimento na Kobo
outubro 25, 2015 § Deixe um comentário
A Kobo é uma fabricante de eReaders, apps de leitura e livraria virtual. Permite um acesso fácil e instantâneo a mais de 4 milhões de títulos de ebooks e revistas.
É possível agora comprar o livro “Conexão do Conhecimento – conectar para gerar ideias, inovações e aprendizado” pela livraria da Kobo, em versão ebook, de uma maneira simples e rápida. É só acessar o site da Kobo Books ou, se preferir, clicando diretamente na capa do livro abaixo.
Também é possível o acesso pela seção “Publicações”.
Edtech – Blended Learning
outubro 22, 2015 § Deixe um comentário
A abordagem para solução de “problemas” tem um apelo maior para os aprendizes do que o repasse conceitual. Este é um fato, apesar das 2 abordagens terem sua importância. O conceito tem o objetivo de fornecer um entendimento crítico a respeito de determinado tema e a implementação, de trabalhar o modo de aplicação de um determinado conceito ou propriedade intelectual. O ideal é “juntar” as duas. Esta é a base de um conceito intitulado blended learning (algo como aprendizado misturado).
Como fazemos com outros conceitos “importados” (como por exemplo, o de startup), o termo blended learning ficou restrito no Brasil à mistura presencial (sala de aula) e não-presencial (ensino a distância), mas vai bem além disto. Ele acontece sempre que se utiliza mais de um “modelo” educacional para estimular a aprendizagem.
Kavita Gupta é uma professora de química da região de São Francisco, Califórnia. Ela iniciou em 2011 uma bem-sucedida abordagem “blended”, utilizando o método de instrução direta (também chamado de “tradicional”) associado com o conceito conhecido como “flipped classroom” (abordado em posts anteriores) – que a grosso modo significa inverter a lógica da sala de aula, fazendo o “dever de casa” em sala e o repasse do conteúdo em “casa” – e com ferramentas online para suporte como podcasts gravados por ela e uma comunidade de suporte via Facebook.
Kavita viu o número de alunos matriculados para suas aulas subir 67% (de 140 para 235) e o AP scores deles (é um resultado consolidado em exame, similar ao nosso ENEM, que permite o ingresso em universidades) subir em média 12%. São números robustos, sem dúvida. Ela sintetiza a sua experiência com blended learning da seguinte maneira:
- O modelo “liberou” tempo em sala para se aprofundar o entendimento da matéria e focar realmente na resolução de “problemas”.
- Os estudantes se engajaram ativamente no aprendizado, trabalhando em conjunto em experiências químicas ou em avaliações por meio de tarefas.
- O aprendizado foi individualizado e “estendido” para além do ambiente formal com a utilização do Facebook, podcasts e sites na internet.
Kavita Gupta concluiu que o modelo blended efetivamente aumentou o engajamento, melhorou o aproveitamento do tempo formal e, “de quebra”, estendeu o tempo dispendido pelos alunos em atividades de aprendizado.
A inevitabilidade da tecnologia
outubro 20, 2015 § Deixe um comentário
Uma questão que tenho ouvido com frequência é a seguinte: “é inevitável o uso da tecnologia na educação”? Como toda pergunta relevante, a resposta não é simples. Do modo como vejo, a resposta é sim e não. No longo prazo sim, é inevitável – e explicarei porque daqui a pouco. No curto e médio prazo, não. Não apenas não é inevitável, como é evitável – obviamente aceitando-se pagar os “custos” sociais que essa decisão acarreta mais adiante.
No longo prazo é inevitável por conta de uma pequena invenção feita a mais ou menos 30 anos, a internet. Ainda não nos damos conta do impacto total dela – creio que no futuro a internet irá inclusive nos modificar biologicamente – mas alguns dos seus impactos já são claramente notados, em especial os que envolvem o nosso comportamento social. Em educação, o seu maior impacto – na minha opinião – é na percepção do que significa ser um professor. Explico: antes da internet, professores (e centros educacionais) eram verdadeiramente as fontes principais de distribuição de conhecimento. Não mais. Obviamente esse tipo de mudança tem seus pontos negativos e positivos, e causa toda sorte de reação a ela, mas se servir de consolo – também na minha opinião – a importância do professor não será diminuída.
Outro grande impacto da internet na educação foi a elevação da importância de uma característica pessoal – que embora admirada, não era considerada essencial pela sociedade – a capacidade de autoaprendizado (na minha época de criança esse pessoal era chamado de “autodidata” e tinha uma áurea de genialidade). É preciso ter em mente que com centros de distribuição de conhecimentos como escolas, universidades e professores, realmente a capacidade de autoaprendizado podia ser relegada a segundo plano. Não mais.
Um dos pontos positivos que a internet possibilitou pelo autoaprendizado foi a diminuição do custo (absurdamente caro) de um aprendizado baseado essencialmente em ambientes formais. Isto dá uma capacidade de monetização a esta habilidade e poder “contar” algo em termos de “grana”, facilita o entendimento da sua relevância – principalmente quando se pode “guardar” o que se conseguiu economizar “estudando por conta própria”. Também é essa capacidade de monetização que possibilita alguém com esta habilidade “valer” mais para aquela entidade meio abstrata, o mercado.
A elevação da importância do autoaprendizado também impacta positivamente em outro tópico de grande interesse para qualquer sistema educacional, a qualidade do seu aprendizado (e é aí que está a importância – não diminuída – do professor – no estimulo desta habilidade alçada a novo patamar – a habilidade de “aprender a aprender”). Qualquer sociedade que já experimentou (ou experimenta) um processo de universalização do seu sistema educacional tem uma característica em comum: a perda da qualidade do seu ensino e aprendizado. Embora natural, é claro que não se pode “cruzar os braços” e não se fazer nada em relação a isto. Algumas sociedades optaram por definir um padrão mínimo aceitável de qualidade e estimular o aparecimento de “centros” de excelência educacional, acessíveis pelo mérito (sabemos que não só, mas também). É um caminho viável e testado – como dizem em inglês, “a sure bet”.
A outra opção é o estímulo ao autoaprendizado, embasado principalmente pelo uso da tecnologia e o acesso à internet. Podem ter a certeza de que está opção já está sendo testada – Finlândia, Canadá, Austrália, alguns estados norte-americanos, Japão, Singapura, Coréia do Sul, alguns locais da China, enfim, a lista é grande. É por esta razão que considero inevitável, no longo prazo, o uso da tecnologia na educação.
Bom, voltemos agora ao curto e médio prazo. Como citei no início do texto, ao se considerar o curto e médio prazo, não apenas não é inevitável como é possível se evitar deliberadamente a tecnologia para fins educacionais. Depende essencialmente da ideologia dos que detêm o poder de tomar ou influenciar essa decisão social (em especial as autoridades públicas, mas também os “formadores de opinião” da sociedade civil e a própria sociedade), da forma de pensar desse pessoal e, principalmente, da importância que dão ao conhecimento.
Citei também no início do texto “custos sociais”, que custos são estes? O século XXI é o “século do conhecimento” – obviamente este é um “chavão”, quem gosta de história pode nomear diversos “séculos do conhecimento” antes do atual – mas este tem uma característica peculiar. Nunca foi tão fácil criar e disponibilizar o conhecimento. Também nunca foi tão fácil “cobrar” por isso – principalmente porque a aplicação prática do conhecimento (também conhecida pelo termo “know-how”) tem uma alta capacidade de monetização. Isto quer dizer que é possível fazer a inovação virar “produtos” ou “negócios” mais facilmente. Quem conseguir estimular consistentemente o uso do autoaprendizado pela sua sociedade irá levar vantagem no “mercado” global, uma vez que terá mais capacidade de gerar consistentemente inovação e entregá-la “embrulhada pra presente”. Os lugares que citei levam vantagem por terem visualizado essa possibilidade antes e saído na frente. Os demais, terão que “correr atrás”. E a distância que deverão “tirar” dos que saíram a frente dependerá do quanto demoraram para aceitar a inevitabilidade da tecnologia.
Edtech – feedback e portfólio digital
outubro 16, 2015 § Deixe um comentário
Um dos pontos comuns a respeito de técnicas de liderança – quem já atuou em algum posto gerencial e teve a oportunidade de participar de um curso destes pode atestar – é a importância de prover feedback para seus liderados de tempos em tempos. Sua maior força é dar a possibilidade de quem o recebe de melhorar (ou se orgulhar do trabalho bem feito). Feedback é a típica atitude com amplo impacto em diferentes ambientes e situações. Pode ser usado tanto em um ambiente corporativo quanto em ambientes mais pessoais como dentro de casa, no futebol entre amigos ou na academia de ginástica. Pode também ser usado (e bem) na sala de aula.
Google Docs, screencasts (quem convive com alguma criança de adora minecraft certamente conhece bem o conceito), Evernote, enfim, há inúmeras ferramentas que podem ser usadas para prover feedback à aprendizes mantendo, entretanto, o “embalo” do aprendizado.
Pesquisadores da Universidade de Chicago recomendam o uso do feedback por áudio ou vídeo para otimizar o engajamento dos aprendizes. Consideram mais eficiente do que o modelo tradicional, por escrito, por algumas razões, entre elas:
- Estudantes reportaram ao estudo realizado pela Universidade, achar o feedback por vídeo mais pessoal e informativo;
- A novidade que envolve o tipo de feedback (por vídeo) e o Efeito Hawthorne[1] que o acompanha, ajuda a estimular o engajamento de quem o recebe;
- A forma “multimodal” do vídeo oferece mais vantagens aos aprendizes mais audiovisuais do que a forma “unimodal” do feedback escrito.
Além do feedback, a “era digital” também facilitou a curadoria do que é produzido pelos aprendizes. Esta aliás, é uma das peças-chave para estimular o engajamento de quem aprende: dar a eles a responsabilidade pelo que criam. Os portfólios digitais desempenham um bom papel na hora de encorajar o compartilhamento de tarefas educacionais. A importância do seu uso está baseada na disponibilização da “evidência” do aprendizado.
As melhores ferramentas para estimular a performance são aquelas que permitem compartilhamentos e comentários não apenas dos pares, mas de outros “personagens” como professores e pais, no caso de estudantes, por exemplo. Nisto, os portfólios digitais cumprem maravilhosamente bem a função por conterem uma ampla gama de informações que capturam, na maioria das vezes adequadamente, a versatilidade da pessoa. As informações em portfólios digitais podem também ser disponibilizadas em uma variedade de mídias como textos, fotos, ilustrações, diagramas, material da web, arquivos de áudio, vídeos, planilhas e apresentações do PowerPoint, o que estimula o uso de múltiplas-inteligências.
Existem diversos softwares e apps que podem ser usados (uma rápida pesquisa no Google pode atestar). Para quem não está familiarizado com o conceito de portfólio digital, recomendo checar o Troove, por ser bastante utilizado em escolas norte-americanas e canadenses e amigável no uso.
[1] O chamado “Efeito Hawthorne” é um tipo de reação psicológica em que indivíduos modificam ou melhoram seu comportamento ao saberem que estão sendo observados. McCarney R, Warner J, Iliffe S, van Haselen R, Griffin M, Fisher P; Warner; Iliffe; Van Haselen; Griffin; Fisher. “The Hawthorne Effect: a randomised, controlled trial”. BMC Med Res Methodology. 2007.
Edtech – Design Thinking
outubro 13, 2015 § Deixe um comentário
O termo “Edtech” vem sendo cada vez mais usado para se referir ao uso da tecnologia em educação. Como é geralmente o caso quando se trata de tecnologia, colocar a “mão na massa” e implementar é o caminho para se descobrir novos usos. Nessa hora, poder se beneficiar da experiência alheia ajuda a “cortar caminho” e ser mais assertivo na hora de escolher a ferramenta mais adequada a sua situação.
Pretendo compartilhar neste e nos próximos posts o uso de algumas tecnologias e conceitos aplicados a elas que têm ajudado bastante a estimular o engajamento de aprendizes. Todas são baseadas em estudos de casos, revisão bibliográfica e documentação de uso (estilo “tentativa-e-erro”) para dar um maior embasamento ao exemplo. Citarei, obviamente, as fontes caso alguém queira se aprofundar no tema.
O primeiro que tratarei é o Design Thinking. Para quem não está familiarizado com o termo, Design Thinking é um método usado por várias indústrias – em especial a de tecnologia – para pensar em soluções de maneira integrada, sem focar especificamente no problema e sim no seu objetivo-macro (“pra que eu quero resolver isso mesmo?”). Esse enfoque leva a duas características do conceito: a primeira é ter o usuário no centro da questão (e não o problema em si). A segunda é uma abordagem interdisciplinar.
Em educação, o Design Thinking tem sido usado associado ao modelo project-based learning (aprendizado baseado em projetos) para redefinir a atitude dos aprendizes em relação ao próprio aprendizado. Um bom exemplo vem do instituto “West Michigan Center for Arts + Technology” (na sigla em inglês – WMCAT) que montou um programa para os estudantes das escolas públicas da região desenvolverem, fora do horário de aulas, soluções que possam beneficiar a comunidade em que vivem. Utilizam a dobradinha Design Thinking + Project-based learning para “misturarem” arte e tecnologia nas suas propostas de projetos e os colocam em prática por meio de equipes, de 12 estudantes cada, durante o ano letivo.
Segundo Kim Dabbs, diretora do WMCAT, a dobradinha proporciona:
- Projetos desenvolvidos e liderados pelos próprios estudantes, estimulando o engajamento ao permitir que escolham os próprios temas de trabalho, os times e parceiros com quem trabalharão e conduzam eles mesmos os trabalhos;
- Oportunidades para introduzir pequenos desafios ao longo do caminho que permite aos professores repassar técnicas artísticas e de desenvolvimento tecnológico, com base nas próprias ideias dos estudantes;
- Oportunidade para aprender na prática o que é e como utilizar o Design Thinking.
O site da WMCAT traz informações adicionais a respeito do projeto e a própria Kim Dabbs conta um caso prático do desenvolvimento de um aplicativo para celular feito pelos próprios estudantes.
Learning Analytics – parte 2
outubro 9, 2015 § 2 Comentários
Terminei o post anterior com um teaser “prometendo” abordar como o conceito pode afetar no futuro o nosso entendimento a respeito do que é educação. Ao invés de “entrar direto” nesse assunto, gostaria de começar com os pontos fracos do modelo. Por mais que se acredite em algo, é preciso considerar os seus possíveis problemas. É apenas desta forma que podemos nos preparar para enfrentá-los, caso se apresentem.
A primeira “leva” deles diz respeito às suas limitações e custos. Quando indicadores (ou qualquer tipo de métrica) são utilizados para interpretar termos subjetivos (por exemplo, engajamento do aprendiz, interesses, etc.), a possibilidade de erros de interpretação é significativa. É preciso considerar esse cenário e entender que muitas vezes se atuará como em um “jogo” de tentativa e erro. Mesmo porque, dificilmente se terá condições de padronização (criar padrões que possam tornar a interpretação mais objetiva).
Dados levantados por organizações[1] voltadas à educação mostraram que de 70% a 85% da análise dos dados levantados por modelos que utilizam o conceito “Learning Analytics” precisam ser feitas por seres humanos. Isto quer dizer que atividades como limpeza, formatação e alinhamento de dados serão feitas por pessoas (e não algoritmos). Não vou negar que isto aumenta (bastante) o custo de um projeto desses.
A segunda “leva” de possíveis problemas explica, de certa forma, porque o conceito ainda não é amplamente usado. Ainda há restrições, tanto de aprendizes quanto de professores, a respeito da privacidade. Quem tem acesso aos dados? Como serão usados? Que tipo de informação pessoal precisa ser usada? São considerações que influenciam na motivação de quem utiliza e que são essenciais quando a quase totalidade dos dados passam por seres humanos. Compreender essas limitações é fundamental para uma “entrega” eficiente utilizando o conceito.
Mudando um pouco o enfoque, vamos pensar nos possíveis impactos do conceito “learning analytics” no futuro da educação. O principal é a mudança no modo de entendermos o aprendizado. Sairemos do entendimento via hipóteses – como é atualmente, baseado em conceitualização, sobretudo teórica – para um entendimento baseado em análise de dados. Isto, por si só, não é pouca coisa porque acrescenta à formação teórica de profissionais de educação a necessidade de entender modelos analíticos. Isto envolve:
- Capacitar educadores a diferenciar via “learning analytics” aprendizes que iniciam lentamente e aceleram em um momento posterior dos que realmente estão com dificuldades no aprendizado.
- Possibilitar que os aprendizes realmente “customizem” o seu aprendizado, fornecendo um retrato amplo da sua performance.
- Introduzir o conceito de peer grading (algo como classificação pelos pares) e self-grading (algo como auto-classificação) associados à classificação pela performance (a temível meritocracia, tão combatida em nosso país) para determinar o nível de graduação dos aprendizes, já que o conceito “meio que” inviabiliza a divisão em turmas ou séries, por ser altamente “customizador”.
- Acrescentar “mais um papel” às várias personas do professor. Além de instrutor e facilitador, também analista. É preciso checar se não é muito papel para uma pessoa só e se a vocação pessoal permite esta inclusão. É muito simples “deixar nas costas” de quem está na ponta esses “pormenores”. Não é pormenor e não são todos os professores dispostos a fazer esse papel. Penso que esse ponto é o maior entrave para o conceito e que não é algo facilmente resolvido. Talvez seja necessário ter vários tipos de profissionais dedicados a promover o aprendizado atuando na ponta, mas obviamente, aumenta (e muito) o custo de uma educação formal.
Vale também acrescentar a necessidade de se estimular desde cedo a habilidade do autoaprendizado. Não adianta criar um ambiente que permita “personalizar” o processo de aprendizado se quem for aprender não tiver a capacidade de conduzir este processo.
Há 3 anos, estudos mostravam um horizonte para a adoção desse conceito por uma quantidade mais ampla de pessoas para 2 ou 3 anos. Esse tempo já transcorreu sem que a previsão se concretizasse. Sou da opinião de que no período de 1 ou 2 gerações (de 25 a 50 anos) teremos um sistema educacional muito diferente do que temos hoje. Quem estava na “escola” por volta de 1990 pode atestar o quanto já mudou nos últimos 25 anos. Como diz o personagem Buzz Lightyear: “ao infinito… e além”.
[1] Organizações como OpenColleges, Edudemics e Educause.
Learning Analytics – parte 1
outubro 6, 2015 § 1 comentário
Citei anteriormente o termo “aprendizado analítico”, minha tradução para “learning analytics”. Ainda que a análise de dados gerados por aprendizes não seja lá uma coisa nova, o conceito de “learning analytics” só ganhou amplo apoio entre pesquisadores e profissionais da educação recentemente.
Quando se ouve falar desse termo em inglês, “analytics”, a primeira coisa que alguém familiarizado com ele pensa é no rastreamento de visitas em um website (seja ele um e-commerce, um blog ou a página da empresa em que trabalha). O “learning analytics” usa esse tipo de dados combinados com a performance do aprendiz e com modelos analíticos para verificar como eles aprendem e como se pode melhorar essa experiência de aprendizado.
O que pode fazer?
- Previsões a respeito de performances futuras, baseadas em padrões passados de aprendizado.
- Intervir quando se perceber diferenças no padrão de comportamento do aprendiz que possam sinalizar dificuldades e direcionar feedbacks que possam ajudá-lo.
- Personalizar o processo de aprendizagem de cada aprendiz, usando seus pontos fortes e encorajando melhorias.
- Adaptar estilos de ensino e de aprendizado via socialização, modelos de aprendizagem e tecnologia.
O modelo é excelente para detectar dificuldades de aprendizado via a performance. Isto é feito da seguinte maneira:
- Reconhecimento de demonstração de frustração, por exemplo em mensagens deixadas no ambiente virtual.
- Diminuição do tempo médio de utilização e atividade no ambiente virtual.
- Longos intervalos entre logins.
- Distinção entre “chute” e conhecimento em respostas de múltipla-escolha.
Um dos motivos pelos quais o conceito demorou a ser aceito, foi porque ele “desafia” outro conceito muito popular na área de educação, a hipótese do aprendiz eficiente – “efficient learner hypothesis” (ELF) – que considera que todos os aprendizes começam em um nível igual – daí a prática do nivelamento educacional – e progridem de forma similar – daí a organização dos alunos em turmas e séries.
Por considerar essencial abranger a discussão em relação ao nosso sistema educacional, adaptei um infográfico para facilitar a compreensão do processo de funcionamento do “learning analytics”.
Disponibilizei um pdf do infográfico na seção Publicações para download gratuito. No próximo post pretendo abordar como o conceito pode afetar o futuro do nosso entendimento a respeito do que é educação.
Conteúdo aberto
outubro 1, 2015 § Deixe um comentário
Apesar de não ser propriamente uma novidade – o conteúdo aberto está por aí basicamente desde o início da web – o tópico tem recebido uma atenção especial nos últimos anos. Eu mesmo só comecei a me familiarizar com o protocolo Creative Commons há pouco mais (ou menos, perdoem-me a memória) de um ano. De qualquer forma, relativamente recente.
O uso de conteúdo aberto (no original “open content” – a variação “open access” também é usada) facilita um bocado a vida de quem quer se manter atualizado em qualquer área do conhecimento. Se torna um ativo quando associado à habilidade de encontrar, avaliar e colocar em uso uma nova informação. Quando utilizado de maneira contextualizada, vira curadoria digital – uma área de grande crescimento quando se trata da “entrega” de informação.
A vantagem de se “criar” processos para utilizar a “riqueza” disponível pelo conteúdo aberto é particularmente compensadora quando voltada ao aprendizado. Quando comparado com um material didático como a apostila ou o livro-texto – pesados, lentos para atualizar e particularmente caros – os conteúdos Creative Commons tem levado vantagens em algumas áreas, particularmente matemática, história e ciências. Ao ser associado a conceitos como “aprendizado analítico” (no original, “learning analytics”) que combina a análise de dados da interação dos aprendizes em ferramentas educacionais, em especial online, com o direcionamento (ou como se diz atualmente, customização) da experiência de aprendizado, os resultados são elevados exponencialmente.
Acredito que conceitos novos são melhor compreendidos quando podemos observar sua aplicação na prática. Dessa forma, gostaria de compartilhar 3 exemplos do uso do conteúdo aberto, envolvendo as 3 áreas que citei acima.
História: Learn NC (algo como “aprenda Carolina do Norte”) é um programa desenvolvido pela Universidade da Carolina do Norte para compartilhar melhores práticas na utilização de recursos online com os professores deste estado norte-americano. Sua “apostila digital” de história (minha tradução para “digital textbook”) contém uma coleção de fontes, leituras e multimídia que podem ser pesquisados e reorganizados pelos professores para se adequarem à necessidade de aprendizado de cada turma, pode inclusive ser individualizado para cada aluno.
Matemática: o professor James Sousa desenvolveu mais de 3.000 vídeos-tutoriais em seu projeto particular intitulado Mathispower4u abordando assuntos que vão de aritmética à cálculo. Todos licenciados com a atribuição Creative Commons.
Ciências: uma parceria entre a Universidade Bringham Young e a Fundação Hewlett, proporcionou um projeto envolvendo professores de todo o estado de Utah, que se reuniram para criarem juntos “apostilas digitais” gratuitas. O projeto Utah Science Open Educational Resources desenvolveu materiais que abordam temas como biologia, química, física e fenômenos naturais, além de um guia de uso para que os professores possam explorar as “apostilas digitais” em sua totalidade.
A internet é possivelmente uma das maiores “tangibilizações” do conceito “batido” e muitas vezes desprezado da democracia. As possibilidades proporcionadas pelo seu uso dependem muito mais de quem a usa do que de quem “permite” o acesso – mesmo nos locais em que o uso é controlado por governos, é possível “burlar” vigilâncias. Essa foi uma das razões da minha “bronca” em relação à condenação do uso de celulares em sala de aula, que comentei no post anterior. Acredito ser mais válido estimular o uso da internet, mostrando suas reais possibilidades – que vão infinitamente além do acesso a redes sociais – do que tentar “fabricar” qualquer espécie de restrição a ela.